Caminho

Suspiro profundo. 
 Finalmente- pensou Julieta.

Não era uma nova vida, mas sim um renascer de vida. Depois de mais de doze meses a batalhar, a travar dores, a conter choro, a lutar contra o abandono, Julieta está sem batalhas para ganhar e sem lutas a travar. Sentia-se finalmente livre de pensamentos do passado.

Fim do mês de Setembro.

Julieta viu Lourenço. De súbito tocou na sua pele, que cobria o seu coração. Sentiu que não tinha parado. Ele, desta vez, não a tinha atraiçoado. Lourenço foi ter com ela. Sorriram. A felicidade reinava o momento. Julieta olhou-o. Todos os pontos possíveis de se verem. Estava igual. Não tinha mudado nada, não tinha crescido um centímetro. Ela sabia exatamente como ele era. Desde o comprimento do cabelo até ao número de calçado.

Lourenço falou, falou... estava tagarela. Julieta mantia-se silenciosa. Apenas queria escutar a pronúncia do amigo
, medir a largura do seu sorriso, os gestos que fazia. Fechou os olhos. Olhou para o Sol que lhe passava o topo da cabeça. Cegou-lhe os olhos por momentos. Não via nada. Apenas pensava em tudo o que Lourenço pronunciava..

Chamada. A música soava nas mãos de Julieta. Atendeu. Era seu pai a pedir-lhe para ir ter com ele. Sentiu um aperto enorme no coração. Ela não queria ir. Mas teve que dizer que sim. Obedeceu à vontade do seu pai. Julieta olhou Lourenço. Houve uma brevíssima pausa de silêncio, até que Julieta se levantou nas escadas onde estava sentada. O chão estava quente. Entre ela e Lourenço estavam uns míseros passos. Entre esses lugares via-se o brilho que o Sol fazia reflectir. Algo a agarrava às escadas. Mas num movimento convicto disse:

-Tenho que me ir embora. O meu pai está à minha espera. Tenho que lhe obedecer. Gostei de te ver, mas tenho mesmo que me ir enbora.

Lourenço respondeu com uma simples palavra 'Adeus'.

Julieta ainda pensa, se foi um 'adeus' de: que hei-de dizer mais? ou um 'adeus' de: 'eu também tenho que ir embora. Só não o quero dizer.'

Para Julieta, nem uma nem outra questão, a incomoda agora.

Quando caminhava para ir ter com o seu pai olhava para trás, para se certificar que ele estava bem. O tempo ia passando, os seus passos iam acelerando e Lourenço ia desaparecendo. Já não o via. Começou a falar sozinha no meio da rua:
-Eu já não sinto saudade. Eu já não sinto a necessidade de o abraçar. Eu já não senti saudade de falar mais o que ele. Eu já não sinto a necessidade de lhe mandar mensagens todos os dias só por mandar. Será que me libertei? Será que o meu amor por ele já terminou? Será que eu já não o amo? Será que.. será que.. Por que estarei a questionar-me? Eu sei que já não sinto mais nada. Eu sei que, finalmente, a amizade por ele é mais forte que o amor!

De repente fez rodar a mochila que trazia às costas, abriu-a no seu compartimento mais pequeno e retirou um pequeno espelho. Olhou para ele fixamente. Tornou outra vez a falar sozinha na rua, com meia dúzia de pessoas a passarem.
- Eu estou livre. O meu coração já não é exclusivamente dele. Eu já não o amo! Passou mais de um ano o meu amor extravagante por ele.
Abriu a suavemente a boca e disse alto:
- Estou livre! Libertei-me!

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