Alma saudosa
Estou com saudades. Sinto saudades. Tenho saudades. Será esta uma palavra válida? Não sei. Talvez seja porque não tenho razões para dizer que não é. É confuso? Sim é, não tenho dúvidas disso.
Quero recuar no tempo. Aquele tempo que deixa saudade, em que um esboçar de lábios significava tudo na vida. Sabia lá eu o que era a vida!...
Hoje não me arrependo de nada, no entanto, em simultâneo, arrependo-me de tudo. Contraditoriamente correto. Tenho vontade de me esmurrar, com aqueles murros tensos e fortes que deixam rasto de sangue, poças de sangue... no coração. Ele bate, bombeia, bate, bombeia, enfim, não deixa de trabalhar. Quero que continue assim, caso inverso, que há-de ser de mim?! Já não poder cantar - com tão doce voz que parte a melodia ao meio sem deixar um pouco de misericórdia, amar - com coração tão ferido e tão sarado, escrever - rios de páginas sem fim, viver - intensamente nas portas do Céu e no fim do Mundo.
Estou farta. Estou chateada. Estou terrivelmente farta e chateada. "Chega!", golpeio com fé. Não consegui perceber de imediato o que se passava. (Parti o bico do meu querido lápis de carvão). Estou cansada de tentar perceber o que se passa comigo, será o "eu/co" que não é "migo"? Talvez.
Meu Santo Deus, tive um arrepio. Surgiu-me, sem como nem por quê, um calafrio neste corpo frágil de tantos combates e lutas desenfreadas. É chegado a este momento que uma força invade a minha alma e me apetece imperativamente estar com a minha avó. Ela dar-me-ia, de imediato, o casaco de lã dela, já velho de tantos anos. Quero-a aqui comigo para cantar aquela saudosa música para adormecer. Aquela música que só ela sabe. Aquela.
Estou com saudades. Saudades de adormecer, saudades de amar, saudades que permaneça inquietamente intacto o meu ser.
É tudo óbvio o que escrevi até agora? Não, claro que não. Mas a vida não se percebe nem, muito menos, é óbvia. Torna-se uma estrada sem sentido, sem direcção. Melhor descrição de saudade que esta? Talvez haja, mas eu ainda não a encontrei.
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